As Práticas Colaborativas e os Desafios da Advocacia de Família

 

Nas questões de família, um processo pode servir a dois propósitos diferentes: resolver uma questão jurídica ou manifestar uma necessidade emocional. Às vezes, as duas coisas aparecem misturadas. Mesmo nesses casos, no entanto, um olhar mais atento pode discernir o que é jurídico e o que pertence ao campo das emoções.

Para facilitar a visualização, vamos pensar em duas situações hipotéticas.

 

Exemplo 1

Depois de 10 anos de relação conjugal, Ernesto descobre que Lucília o havia traído. Nas discussões relativas ao divórcio, mesmo sabendo que Lucília é uma excelente mãe, Ernesto insiste em ter a guarda unilateral dos filhos.

A questão jurídica é simples: se os dois pais possuem interesse e demonstram boas condições de cuidar dos filhos, a guarda deve ser compartilhada. Mas a questão emocional é complexa: magoado com Lucília, Ernesto fará de tudo para feri-la ao longo do processo de divórcio.

 

Exemplo 2

Vítima de uma enfermidade de evolução lenta, Regina faleceu, deixando apenas os quatro filhos adultos. Como um dos filhos não se envolveu nos cuidados com a mãe, os outros três queriam excluí-lo da partilha dos bens ou, no mínimo, fazer com que ele ficasse com uma parte consideravelmente menor.

Aqui, novamente, a questão jurídica é simples: cada um dos filhos deverá receber 25% do patrimônio deixado pela mãe. Mas a questão emocional é complexa: magoados com um dos irmãos, os outros três expressarão os sentimentos negativos por meio do processo de inventário.

 

A advocacia tradicional

Na advocacia tradicional, cabe ao advogado lidar conjuntamente com questões jurídicas e questões emocionais. O problema é que ele não tem formação profissional para esse tipo de desafio. E aí existem dois caminhos possíveis. Caso o advogado seja sensível e maduro, ele vai lutar para que as questões emocionais não atrapalhem a solução dos problemas jurídicos, utilizando, para tanto, muitas horas de conversa e altas doses de bom senso. Mas se o advogado não tiver sensibilidade ou maturidade suficientes, ele sequer poderá perceber que há outras coisas em jogo além de artigos do Código Civil. E mesmo se chegar a percebê-las, a tendência é que ele as considere como simples capricho dos envolvidos.

É por isso que a advocacia tradicional acaba ferindo a consciência dos advogados mais sensíveis e tornando cínicos todos os demais. Quem ama o Direito e tem verdadeiro interesse nos dramas de seus clientes, acaba sofrendo com as batalhas travadas no Judiciário. E para quem acha que Direito é mercadoria e banca de advogado é o mesmo que balcão de supermercado, bom, para esses, quanto pior, melhor.

 

A advocacia colaborativa

A advocacia colaborativa é a metodologia de trabalho criada por advogados norte-americanos, amplamente utilizada em países de língua inglesa e já bastante divulgada no Brasil, cujas principais características são o acordo de não-litigância e o trabalho em equipes interdisciplinares.

Por meio do acordo de não-litigância, os advogados se comprometem a somente assistir seus clientes em negociações extrajudiciais, renunciando ao mandato caso um deles queira iniciar um processo contencioso. Isso significa que o procedimento só terá início se os interessados tiverem clareza de que realmente desejam resolver um conflito. Não é preciso que eles sejam amigos ou que amem um ao outro. Mas é essencial que o propósito deles não seja o de produzir ferimentos mútuos.

A segunda característica da advocacia colaborativa é o modo natural com que os advogados acionam profissionais de outras áreas, tais como psicologia e finanças, convidando-os a participar da solução do conflito. Agindo assim, o advogado pode se concentrar nas questões jurídicas, para as quais tem formação profissional adequada, deixando com outros colegas aquelas que ultrapassam os domínios do Direito.

 

Desafios da Advocacia de Família

Para o advogado acostumado com o campo de batalha das relações familiares, surgem alguns desafios para migrar do modelo contencioso para o modelo colaborativo.

O primeiro é o de obter formação adequada. Para tanto, deverá estudar não apenas a metodologia colaborativa propriamente dita, mas também os campos teóricos da mediação e da negociação.

O segundo é o de convencer os clientes a experimentar a abordagem colaborativa. Para tanto, deverá ser capaz de levá-los a olhar o conflito de uma perspectiva mais ampla, ajudando-os a separar os verdadeiros interesses, pelos quais compensa lutar, das posições intransigentes, de que vale a pena abrir mão.

O terceiro é encontrar uma comunidade de profissionais colaborativos. Para tanto, os dois principais caminhos são o Instituto Brasileiro de Práticas Colaborativas e as várias comissões especiais em funcionamento das sedes estaduais da Ordem dos Advogados do Brasil, entre as quais, a do Rio de Janeiro, a de São Paulo, a do Paraná, a da Bahia e a de Minas Gerais.

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